Pelo menos uma vez por semana na hora do almoço, eu ia à lanchonete que ficava em frente à minha escola.
Apesar de minha mãe sempre preparar o meu lanche, quase sempre ficava aguando um bagel. Saía uma fornada quentinha duas vezes ao dia e o intervalo na escola correspondia à segunda fornada.
Meu preferido era o bagel de cebola com uma camada fina de cream cheese.
Eu ia lá há tanto tempo que todos os atendentes já me conheciam e cortavam e esquentavam meu bagel antes mesmo que eu passasse pela porta.
Sentia-me prestigiado com isso.
Isso me dava uma sensação de pertencimento pela qual ansiava naquela época.
Só tinha um cara — um cara mais velho, com costeletas grisalhas espessas e sobrancelhas cerradas — que me fazia fazer meu pedido todas as vezes.
Enquanto os outros balconistas me perguntavam como eu estava indo na escola ou, ao ficar mais velho, se eu tinha encontrado alguma garota legal, esse homem nunca falava comigo sobre nada pessoal.
Eu pedia educadamente meu bagel de cebola, só com um pouquinho de cream cheese. E, quando ficava pronto, ele não me entregava diretamente como os outros faziam, mas deixava com o caixa.
Então, quando eu abria o bagel, invariavelmente encontrava uma camada grossa de cream cheese, tendo que raspar o excesso para conseguir comer.
No início, eu raspava o excesso de cream cheese fora da loja, porque não queria que o homem ficasse chateado por ter cometido um erro.
Mas, com o passar do tempo e ele continuando a ignorar solenemente meu pedido de só um pouquinho de cream chesse, comecei a raspar o excesso bem na frente dele, esperando que ele entendesse a mensagem. Nunca o confrontei diretamente. Pensei em dar-lhe uma lição de humildade ao retirar visivelmente o excesso de cream cheese. Mas, se notou, nunca deu a entender.
Assim como levei para o lado pessoal o outro homem se lembrar do meu pedido usual, também levei para o lado pessoal o fato de este homem sempre errar o meu pedido.
Ao limpar o bagel, observava suas interações com os outros clientes.
Às vezes, ele era tão taciturno com os outros quanto era comigo.
Mas, com a mesma frequência, perguntava a alguém sobre o tempo ou ria de algum acontecimento ocorrido na semana anterior.
Fiquei enredado em nossa dinâmica, a tal ponto que comecei a ir à lanchonete mesmo nos dias em que nem estava cem tanta vontade assim de comer um bagel. Minha raiva do homem da lanchonete cresceu tanto que às vezes pensava nele de noite antes de adormecer.
Toda vez em que me lembrava da forma como ele me tratava, ficava revoltado de raiva de novo.
Felizmente, estava focado na Fórmula de Transformação em meus estudos de Cabala e recentemente tinha aprendido uma lição com o garoto que colava de mim nas provas. Então decidi resistir ao meu comportamento reativo, mas, ao mesmo tempo, não tinha muita certeza no que isso implicava.
Isso queria dizer que eu deveria procurar uma outra lanchonete?
Não havia outras por perto.
E, além disso, estes eram os meus bagels preferidos. Isso queria dizer que eu não deveria pedir bagel nos dias em que ele estivesse trabalhando?
Ou que se ele fosse o atendente a me servir, eu deveria dar a vez a outro freguês e esperar ser servido por outra pessoa?
Nenhuma dessas soluções me parecia certa.
Decidi continuar a ir à lanchonete nos dias em que realmente estivesse a fim de comer bagel e fazer meu pedido a quem estivesse disponível, mas parar de raspar o cream cheese do meu bagel na frente do homem.
Então uma coisa estranha aconteceu: comecei a gostar do meu bagel com mais cream cheese. Não todos os dias, mas nos dias em que aquele homem fazia o meu sanduíche, comecei a achar reconfortante o cream cheese a mais.
Quando era ele quem me atendia, parei de pedir menos cream cheese.
Recebia exatamente o mesmo bagel de sempre, mas não estava mais construindo um obstáculo para gostar do bagel.
Não estava mais me fazendo de vítima.
Tinha criado espaço para aproveitar algo de novo.
Depois de praticar gostar do que o homem me dava por vários meses, experimentei pedir menos cream cheese e educadamente chamar a atenção dele para o fato de que punha cream cheese demais.
Ele ouviu, assentiu com a cabeça e depois disse: "Que bom que você falou.
Vou me lembrar da próxima vez."
E assim foi, mas, verdade seja dita, comecei a sentir falta da dose extra de cream cheese!
Por um momento, pensei se o homem tinha estado esperando que eu me expressasse em palavras em vez de tentar, de forma passiva-agressiva, puni-lo, mas abri mão desses pensamentos.
Não há como saber de verdade o que está acontecendo na mente de outra pessoa. Pense como é difícil saber o que se passa na sua própria mente!
Do que abri mão, no entanto, foi da prática de resistir ao meu comportamento reativo.
Nesse caso, eu tinha levado um tempo para entender os "comos", mas, depois que fiz isso, os resultados foram instantâneos e maravilhosos. Comecei a apreciar mais a vida, curtindo o meu almoço de uma forma nova e inesperada.
Além disso, removi o estresse de um ambiente que frequentava sempre.
Isso pode soar como um pequeno acontecimento na minha vida, mas, na verdade, foi central.
Ele me mostrou, de todas as formas, a conexão direta entre Resistência e a Luz. Uma das coisas que comecei a perceber durante esse tempo foi que quanto maior o problema que eu enfrentava, tanto maior era o impulso para reagir.
E quanto maior minha reação em potencial, mais Resistência eu tinha que opor.
E quanto mais Resistência eu opunha, mais Luz eu permitia que entrasse na minha vida.
Apesar de não poder dizer que passei conscientemente a procurar enfrentar obstáculos, minha reação a eles certamente mudou. Se eu pudesse treinar minha mente a reagir com gentileza e compaixão tanto em relação a mim mesmo quanto ao Oponente, minha vida se tornaria ainda mais rica.
O que aprendi com o homem do bagel, depois apliquei ao professor que me deu uma nota muito menor do que eu achava que merecia.
E ao treinador que me fez ficar no banco de reservas num jogo de basquete importante.
E ao meu irmão, que pegou minha caneta-tinteiro e a perdeu.
E aos meus pais, que, com a melhor das intenções, tinham dificultado minha vida traçando um caminho tão diferente do dos outros.
Houve momentos em que fiquei com tanta raiva que tive vontade de esmurrar alguém e momentos em que fiquei tão triste que quis me deitar em posição fetal e chorar.
Depois houve momentos em que fiquei tão feliz e em êxtase, que não conseguia ficar quieto sentado. Em cada situação, lutei contra meu comportamento reativo. Lembrei-me que os atos ou comentários das outras pessoas não eram dirigidos a mim e, mesmo se fossem, isso não queria dizer que eu tinha que reagir a eles, de forma positiva ou negativa, de maneira a me desconectar nesse momento específico.
A mudança começa com a nossa vontade de sentir pelo que estamos passando, e não conseguimos fazer isso se sairmos do momento presente adotando um comportamento reativo.
Para nos transformarmos de verdade, precisamos nos abrir para ter uma relação compassiva com todas as partes de nós mesmos — mesmo as partes de que mais desgostamos, as partes que nos causam mais problema.
Mas como vamos conseguir conhecer essas partes se ficarmos sempre nos escondendo ou gritando ou fugindo?
E, ao refrearmos nosso comportamento reativo, poderemos pensar nele, senti-lo, conhecê-lo.
E, ao fazer isso, podemos transformá-lo em comportamento proativo, que é curativo tanto para nós quanto para os outros.
Meu ADD foi talvez o maior obstáculo que enfrentei naquela época e, de muitas formas, isso parece continuar a ser verdade hoje.
Não é o tipo de coisa que se resolve por si só, tive que me adaptar a isso.
Mas depois que parei de ficar tão zangado comigo mesmo e com minha sorte na vida, tive condições de apreciar o meu ADD.
Assim como aprendi a gostar de bagel com muito cream cheese, aprendi a apreciar os diferentes caminhos que meu ADD me levou a trilhar.
Tornei-me uma pessoa muito mais forte por ter que aprender a como cuidar de mim de maneiras específicas. Meu ADD também me protegeu de muitas situações potencialmente perigosas. E, por ter que deixar a escola em momentos de sofrimento, acabei me metendo em várias aventuras e conheci pessoas interessantes.
Comecei a encarar o meu ADD como um presente, e é assim ainda hoje.
Tudo tem uma razão de ser.
E, por causa disso, tudo é um presente.
Quanto mais entendemos isso, mais podemos refrear nosso comportamento reativo. E, quanto mais refreamos nosso comportamento reativo, mais nossas vidas ficarão repletas de Luz em termos práticos; aprender a resistir ao comportamento reativo é como aprender uma nova habilidade.
É preciso praticar e é preciso começar do zero.
Não faz sentido acordar amanhã de manhã e decidir resistir a seu maior e mais doloroso comportamento reativo.
É preciso se preparar para isso.
Comece a praticar com a garota que fura a fila na cantina da escola ou com o cara que pega a sua vaga no estacionamento.
Depois aos poucos passe para pessoas com quem tenha relações mais próximas: amigos íntimos, parentes, talvez um professor.
Depois que comecei a trabalhar como professor e escritor, tive a honra de conhecer muitos adolescentes. Tenho alguma ideia dos problemas pelos quais eles passam, as inúmeras decisões que precisam ser tomadas a cada dia.
Nem sempre é claro definir quais situações exigem Resistência e quais não.
Então, sigam seus instintos.
Prestem atenção especial aos casos em que sabem que algo é ruim para vocês, mas decidem fazer isso de qualquer forma — ou quando têm uma sensação estranha no estômago que lhes deixa entender que algo está acontecendo.
E não se esqueça que o comportamento reativo gira em torno tanto de momentos positivos quanto de obstáculos.
É igualmente fácil ficar viciado em elogios e na sensação de pertencimento.
Ao se sentir seguro, inteligente ou bonito por causa de um elogio ou sensação de inclusão, estamos reagindo à ideia que os outros têm de nós, e não a nossa própria ideia a respeito de nós mesmos.
E embora isso seja um comportamento humano comum, é comportamento reativo também.
Então, ao praticar a Resistência, certifique-se de trabalhar com elogios bem como com insultos!
Uma moça conhecida minha aplicou a Fórmula da Transformação a um problema que estava tendo com o sexo.
Ela estava saindo com um rapaz de quem ela gostava muito há cerca de um mês e ele a estava pressionando. Ela também queria transar, mas só depois que o conhecesse melhor e não necessariamente dentro do carro dele, na ida ou na volta da escola.
Ele era um rapaz carismático e cada vez que eles ficavam juntos, ela se via permitindo que ele avançasse um pouco mais.
Ele era seu primeiro namorado e ela não queria desapontá-lo.
Aí as notas delas começaram a cair, ela começou a brigar mais com os pais e seus amigos começaram a reclamar do seu sumiço.
Se fosse honesta de verdade consigo mesma, teria que admitir que não estava pronta para o sexo. Mas não queria perder o namorado.
Por fim, percebeu que, cada vez que fazia sexo com seu namorado, estava sendo reativa.
Ela o tornara a causa e a si mesmo, o efeito.
Esse ritual que compartilhavam a respeito de tudo, de sexo oral a uma rapidinha no carro antes da aula, lhe dava uma falsa sensação de pertencimento.
Ela vinha reagindo às expectativas dele a seu respeito e, ao fazer isso, ela tinha se fechado para a Luz.
Depois de estudar Cabala, essa garota foi capaz de repensar sua relação com o namorado e decidiu que, na próxima vez que ele fizesse uma investida sexual, ela recusaria. Ela estaria sendo verdadeira consigo mesma.
Se ele terminasse o namoro por causa disso, que assim fosse.
Porém, ela sabia que tinha que ser proativa.
Não foi fácil.
Na manhã seguinte, ele a levou para a escola de carro e estacionou como sempre na ruazinha transversal. Depois de alguns beijos preliminares, ele pôs a mão por baixo da saia dela e ficou espantado e depois zangado quando ela a tirou.
No dia seguinte, a situação se repetiu.
No outro dia também. Ele foi ficando cada vez mais zangado com ela, mas ela se segurou para não ter um comportamento reativo. Ao contrário, disse-lhe claramente que, apesar de gostar de beijar e dar uns amassos, não estava curtindo transar e tinha decidido não fazer mais isso com ele — pelo menos até que as coisas entre eles amadurecessem de forma mais natural. Por fim, depois de um rompimento sofrido que durou várias semanas, ele veio falar com ela cheio de remorsos e disse-lhe que a decisão dela estava certa e que admirava a sua força. Ele perguntou se ela não gostaria de pensar em voltar com ele, se as coisas fossem mais devagar.
Ela concordou e muitos anos depois eles ainda estavam felizes juntos.
Nem todas as histórias de Resistência têm final feliz.
Mas frequentemente quando você desiste de pessoas e coisas consideradas preciosas no passado, os sentimentos que procura voltam a você de maneiras diferentes.
Por exemplo, essa moça podia ter perdido o namorado para sempre, mesmo que ele tivesse mudado de ideia — mas, ao ficar sozinha de novo, ela poderia se abrir para encontrar um rapaz mais apropriado, mais em sintonia com seus sonhos e metas.
Não temos como prever isso, mas podemos vivenciar isso.
E vivenciamos isso resistindo.
Estamos no controle de nossas vidas, mas a única maneira de vivenciar isso é por meio da Resistência.
Nossa sociedade nos estimula a trilhar o caminho da menor resistência, para alcançar situações fáceis e confortáveis na vida.
Pensamos que, ao fazer isso, estamos nos protegendo do sofrimento e, portanto, estamos sendo bondosos conosco mesmos.
Mas, na verdade, essa atitude só nos deixa mais temerosos e mais alienados.
Isso reforça nossa sensação de isolamento e essa separação age como uma prisão. Ela restringe nossa habilidade de cuidar de nós mesmos e dos outros, até dos mais próximos. Curiosamente, quanto mais tentamos nos proteger do desconforto, mais sofremos.
Só ao nos abrirmos para isso é que podemos reconhecer nossa afinidade com todas as coisas. É disso que tratam esses passos: amar o semelhante — todos os semelhantes e não apenas de quem gostamos — como a nós mesmos.
Ficar no conforto não gera Luz duradoura.
Estes textos são um desafio a deixar sua zona de conforto e saudar situações desconfortáveis.
Sim, o caminho da maior Resistência causa dor e desconforto, mas depois que isso diminui percebemos que o caminho de maior Resistência é a única maneira de gerar realização infinita, alegria irrestrita e iluminação ilimitada.
Imagine que Deus lhe diga que lhe daria um milhão de dólares (um milhão de dólares!) toda vez que alguém o magoasse ou deixasse com raiva, desde que você abrisse mão de qualquer comportamento reativo.
É provável que você passasse a acordar de manhã rezando para que alguém o magoasse. E, quando o fizesse, você praticaria a Fórmula da Transformação com toda a força de pensamento.
Dinheiro é transitório — você o gasta, o supermercado o engole, alguém o rouba, etc. Mas a realização infinita dura para sempre.
E Deus está lhe oferecendo exatamente esta barganha.
Aceite o desafio.
Quanto mais resistir, mais cheio de Luz seu mundo ficará.
Por: Yehuda Berg
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